domingo, 20 de dezembro de 2015

Sair de casa. Deixar de espiar o mundo lá fora.



  Todos que passaram por minha porta nestes últimos meses viram o aviso de luto por tempo indeterminado. Aquele sinal ali empregado, por fim, começou a ser parte da arquitetura e a entranhar-se na estrutura da casa onde habitava. Os muros são fracos e manchados de mofo, mas o suficiente para abrigar e aquecer um desajustado que nasceu com a cabeça voltada contra o vento. 
  Às vezes abria uma fresta para aqueles que se deparavam e observavam com curiosidade. O aviso intimidava. Nunca entrou uma alma sequer ali, a não ser o solitário eremita. Quando ousava sair, não o fazia sem levar sobre as costas o peso de suas vigas e de sua base. Doía-lhe a coluna. Doía-lhe a cabeça.
  Inverno, para ele, era sempre o lado de fora. O frio vinha do olhar, do agir e do falar das pessoas. Das línguas nunca vieram frutos maduros e dos braços nunca trabalho útil, Primavera estava dentro da concha. Verão era dentro da carapaça. O conforto estava no limite entre ele e as paredes duras, nem sempre frias.
  Foi no romper do silêncio e da sintonia que uma pedra estilhaçou a janela. Cruzou toda a sala e ricocheteou na parede, no outro canto. Alguém o obrigou a sair, nem que seja para esfregar o luto às fuças e em resposta tê-lo molhado em cuspe. Que desprezo, não!? Mas foi capaz de depois de tempos reviver a imagem do solitário sem sua armadura. Sentiu-se nu, mas se se mantivesse vestido, veria o momento escorrer pelos dedos e evaporar-se.
  Não a figura de um ser que ousou desafiar, mas a beleza da coragem de seu ato o cativou. Se não se mexesse, perderia a chance de olhar nos olhos do tal feitor. Em dois minutos decidir-se: voltar para dentro ou seguir a espiá-lo até, pelo menos, o fim da rua?

terça-feira, 22 de setembro de 2015

Um Último Trago





   Sentado na janela, saboreava a brisa calma e morna das primeiras noites de primavera. O cigarro entre os dedos e os olhos no céu limpo, pontilhado por estrelas. Corpo presente, mas a mente respirava em outro lugar secreto. Quem olhasse, saberia que não estava ali por inteiro. Lápis na mão e um pedaço de papel a frente. Desenhava algumas letras e logo às desfazia. O cigarro queima. Entre curtas tragadas olhava para o céu e se voltava para o papel. Queria escrever muitas coisas, mas o espaço era pequeno. Pensava nas melhores palavras, mas de pronto às abandonava. Precisava escrever! Respirava como se a alma estivesse pronta a sair de seu corpo e fazer uma viagem longa. Sem certeza se voltaria. Sentia a brisa e o cheiro da mistura de tabaco e papel queimado. 
   A mente oferecia um vocabulário extenso, mas a língua não lhe servia. Queria vomitar um milhão de palavras traduzidas de seu idioma pessoal. Os dedos se voluntariavam, mas não eram exitosos. Indagavam: "O que quer dizer?" e logo desfaziam todo o árduo trabalho outrora escrito. "O que quer dizer?" Ora, quer dizer tudo! Mas tudo é demais para a língua que sabia falar. Acumulava-se na garganta e já quase transbordava pelos olhos. Dava mais um trago e se voltava ao céu. A brisa mexia com as folhas da árvore a frente e, com seu som, perturbava a noite calma e especialmente quente. Tinha que transbordar! E choveu em gotas de oceano. Aquele que queria jorrar pela boca e se continha um pouco antes das cordas vocais. 
   Pensava em seu egoísmo. Pensava em sua solidão. Solidão que só o coração sentia e que nunca se ia, mesmo quando algumas taças de vinho estavam presentes. Que outros sorrisos se exibiram em sua presença, mas nenhum alcançou a profundidade daquele olhar. Tal que via, e entendia, o que tinha atrás de cada estrela. Traga a última porção de fumaça e descarta a bituca no gramado a frente. Observa seu caminho até o chão. Viajou por mais de dez metros até lá. Olhou uma vez mais para o céu. Desistiu do papel. Secou o rosto e a seguiu. A alcançou e de dentro dele explodiu tudo o que queria dizer. Nas janelas, nas paredes, na árvore e por quase toda a grama. Tudo está repleto de sentido agora.

quarta-feira, 17 de junho de 2015

"Tome um rumo, menino!"








 Em uma madrugada qualquer destas, estava ali em um ponto de ônibus deserto uma figura delgada. Óculos grandes e aparentava ser bastante mais jovem para sua real idade. Chovia uma chuva fina e ventava forte. Olhava para todos os lados da rua e seus olhos pesados lutavam para manter-se abertos.
  Esperava um ônibus, mas não sabia para onde ir. Linhas para todos os pontos da cidade eram atendidas por aquele ponto. Mas ele não sabia para onde ir. Apenas havia chegado de algum lugar que não era para ele. Aquele ponto era famoso por isto. Era um ponto de baldeação de trabalhadores pelas manhãs, de estudantes pela tarde e de boêmios pela noite. As madrugadas eram dos vagantes. Esperavam ali solitários para sabe-se lá onde.

  Não podia estar ali por toda uma noite. Precisava se decidir rápido. O risco de acidentes ou assaltos era eminente. Veio um ônibus rumo a zona sul. De lá havia vindo, mas tomou-o outra vez.
  Espera encontrar um lugar diferente. Espero abordá-lo com outros olhos. Quer sentir-se em casa, mas em casa não é possível quando se tem que escolher demais para que lado ir. Não era mais o mesmo de cinco minutos atrás. Não queria ser o de cinco minutos a frente.

  Deve ir para algum lugar, mas quer descansar. Têm que encontrar o seu lugar, mas quer dormir. Têm que encontrar sua onda e deixar ser empurrado por ela.

terça-feira, 17 de fevereiro de 2015

Me Fui, Pero Aún Estoy







"He pasado tanto tiempo lamentando lo que no entendia
Ahora prefiero que me dén las claras del dia"

Si fui, fui para superar. Pero cuando se abre puertas hay que abrazar lo que hay detrás.
Aunque he encerrado mis ojos y cruzado mis brazos caminé p'adentro de un hueco oscuro
Allá encontré! En la forma en que siempre busqué.
Sabia que no podria agarrarme a algo que estaba en donde habia explorado.
Pero lo hize.
Cuando me di cuenta ya estaba ahogado en aguas prohibidas.
Y se me rompen mi cuerda. Me atrapan y me llevan.

Acá estoy yo. Mirando de la ventana hacia el sur.
Luchando pa hacerme vivo todo el pasado que vi.
No se puede dejar ir lo que se intentaba alcanzar desde mucho.
Pero no se puede aguantar lo que no está en suelo firme.

"Soy una montaña rusa que sube, que baja
Que ríe, que calla, que llora
Confuso sin saber donde estar
Sin saber donde mirar
Sin saber que pensar"